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Opinião

  • admjornale
  • há 3 horas
  • 4 min de leitura

15/12/2025


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Embora Sócrates pudesse enriquecer com as dádivas e presentes que diariamente queriam forçá-lo a receber, sempre os devolvia. Certa vez, ao receber uma crítica de Antifone, por não ter nem mesmo roupas para trocar (embora asseado, Sócrates usava sempre as mesmas vestes, tanto no inverno quanto no verão), feliz na sua pobreza, observou o engano dos que pensam encontrar a felicidade na vestimenta ou na abundância. Revelou ser a LIBERDADE o mais rico tesouro do homem.


Essa lição filosófica antiga encontra eco na realidade contemporânea. O Brasil, nos últimos anos, tem enfrentado retrocessos significativos no combate à corrupção. Em 2024, o país ocupou a 107ª posição, entre 180 países, no Índice de Percepção de Corrupção da Transparência Internacional. Foi a sua pior avaliação desde o início da série histórica comparável, em 2012.


Quando pensamos em corrupção, imediatamente imaginamos o pagamento em dinheiro, comissão de 10% ou até mais... em troca de uma ilegalidade. Contudo, pior do que a corrupção movida por dinheiro são as modalidades que surgem da omissão, da submissão e da influência econômica ou política: o “fingir que não vê”, o “receber e prestar favores”, o favorecer ou acomodar o que sabe ser ilegal. Essas práticas, além de repugnantes, causam um prejuízo irreparável para a formação cultural brasileira. É preciso despertar a consciência de que isso não é normal e combatermos essa tal síndrome da normose.


Kant dizia da importância de sairmos da minoridade com esclarecimento. Ser esclarecido é poder servir-se da nossa própria liberdade de entendimento sem seguir os passos dos outros. Se estivermos acordados, conscientes, nós poderemos eliminar, passo a passo, todas essas formas de corrupção. Com isso podemos fazer cumprir o preâmbulo da nossa Constituição que diz tudo: “... assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos...”.


Mas, onde estão as nossas referências? Cadê os bons exemplos?

Em uma época em que a ciência e a técnica avançam vertiginosamente, parece que o desenvolvimento espiritual permanece estagnado.

O progresso espiritual está diretamente ligado à evolução dos padrões éticos da sociedade, e, nesse aspecto, enfrentamos a ausência de referências sólidas. Situações antiéticas, imorais e até ilegais tornaram-se comuns, alimentando um ambiente de desencanto.


Talvez precisemos revisitar nossas referências clássicas — Sócrates, Aristóteles, Santo Agostinho, São Tomás de Aquino, Kant — mas, mais do que isso, precisamos cultivar boas referências vivas, construídas pelas nossas condutas diárias. No passado, profissões como a de farmacêutico, médico, padre e juiz eram símbolos de elevada confiança social. Hoje, notícias de corrupção, abusos ou desvios envolvendo esses mesmos profissionais não podem servir de desânimo, mas sim de alerta: em qualquer área, há inúmeras pessoas de bem capazes de resgatar a ética profissional e social.


Mais do que discursos, é a prática que importa. Se a liberdade é o mais rico tesouro do homem, a honestidade é o seu mais nobre dever, obrigação de todos os seres humanos.


A administração pública, conforme o art. 37 da Constituição da República, em qualquer dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), deve obedecer o primeiro dos princípios que é o da legalidade. O cumprimento da lei (legalidade) e a realização do Direito são os próprios objetivos do Estado.


Por isso, não se omitir perante qualquer forma de violência, ilegalidade ou corrupção é uma forma de combater a normose e oportunidade de reafirmar a autoridade moral da Administração Pública e resgatar as nossas referências morais.


A legislação brasileira oferece diversos instrumentos de controle: controles internos, ouvidorias, corregedorias, controles externos pelos Tribunais de Contas, pelo Ministério Público, e ainda os instrumentos jurisdicionais, como o Mandado de Segurança Coletivo, Ação Popular, Mandado de Injunção, Ação de Inconstitucionalidade por omissão, Ação Civil Pública. Aliados a uma genuína vontade política, esses mecanismos permitem que a sociedade e o Estado combatam a corrupção com eficiência.


De tanto ver triunfar as nulidades, crescer as injustiças e agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, rir-se da honra e ter vergonha de ser honesto (Ruy Barbosa).


Não podemos permitir que esse sentimento se torne regra, seja considerado normal (se torne norma). No dia 09 de dezembro, celebra-se o Dia Internacional de Combate à Corrupção, data que reforça a necessidade de intensificar esforços, fortalecer instituições e reafirmar valores éticos (individuais e coletivos).


Diante de tudo isso, o que lhe parece? Estamos escolhendo ser parte da mudança ou, pelo silêncio e pela conivência, estamos ajudando a manter exatamente aquilo que tanto criticamos?


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Roberto Portugal Bacellar é desembargador do TJPR, Diretor-Geral da Escola Judicial do Paraná e Professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados


Foto: Divulgação


 
 
 

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